Tem se multiplicado, diante dos meus olhos, formas de projeção e catarse disfarçadas de expressão religiosa. Cresce a religião, mas Deus… Deus segue à parte. Como uma vitrine decorada, onde tudo é bonito por fora, mas vazio por dentro.
Vejo neuroses se manifestando como normalidade. Psicóticos são aplaudidos, ganham status, espaço e identificação com plateias igualmente adoecidas. Isso se alastra nas escolas, nas faculdades, e recebe justificativas ideológicas sob a bênção de bolhas sociais que se retroalimentam. E nos nossos templos… onde a doutrina do coaching e o neopentecostalismo se abraçam, falta a humildade de Jesus. Falta a compaixão que tocava cegos, leprosos e lunáticos.
Hoje, narcisistas conduzem multidões de solitários — sedentos por uma gota de paz, de amor, de sentido — tentando suprir suas almas exaustas.

Como resultado? Escolas violentas. Púlpitos transformados em palcos. Uma sociedade cada vez mais leprosa — não do corpo, mas do espírito.
Em minha mente ecoam as palavras do Jesus: “Os sãos não precisam de médico, mas sim os doentes” (Mateus 9:12). Mas parece que muitos nem sequer reconhecem sua enfermidade de alma, vivem enbebedados pelos discursos vazios que entorpecem o a alma. Gritos e vozes que impedem escutar os gemidos da alma.
Quero elogiar a cegueira, pois, assim os olhos dos cegos conseguem conteplar a escuridão de sentido que estamos mergulhados. Só os cegos podem enchergar isso e conseguem olhar para escuridão enquanto caminham.
Somos falta, carêcia, uma construção de quem “eu ideal” acho que sou e de quem sou realmente. Tavez Lacan não tenha bercebido, mas essa falta também nos abrigra.
Há uma história antiga narrada no livro de Marcos (10:46) que retrata bem essa condição de cegueira imbuido na alma humana. Ela conta a expêriencia de um pedinte cego, chamado Bartimeu. O homem ficava parado na beira da estrada enquento uma multidão seguia Jesus. Ele então começou a clamar “: “Jesus, Filho de David, tem misericórdia de mim!”. A condição desse homem é de quem encherga sua condição, que apesar da tentativa da multidão de religiosas de o fazer calar, o cego se mantia firma no seu intento de clamar por misericórdia à Jesus.
Essa é nossa condição: cegos, doentes e solitários, presos na escuridão de nossa própria natureza. O que nos separa da multidão que diz seguir Jesus, mas quer afastar os doentes daquele que realmente pode curar a alma é a capacidade de reconhecer a própria condição e clamar por misericórdia à aquele que disse: “Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração; e encontrareis descanso para as vossas almas” – Mateus 11:29
Há mais de dois mil anos pregamos o mesmo Evangelho. Mas a maioria de nós quer ser aplaudida, adorada. De forma inconsciente, somos covardes. Temos medo de admitir que somos totalmente dependentes da Graça de Deus. Então o que fazemos? Criamos fantasias para esconder nossa solidão, nossos medos e dores. É como tentar se esconder de se mesmo.
Damos nomes sofisticados a essas fantasias: religião, ideologias políticas, ou até filosofias sofisticadas. Mas tudo não passa de uma tentativa vazia de justificar as ilusões com as quais gritamos por acolhimento, por visibilidade, por adoração. Queremos ser vistos, ouvidos, admirados. Enquanto o velho homem não desistir dessa obsessão doentia por idolatria, viveremos numa eterna barbárie existencial.
É necessário refletir nas palavras do mestre: “quem quiser salvar a sua vida, a perderá; mas quem perder a sua vida por minha causa, a encontrará” – Jesus Nazaré (Mateus 16:25).
A cegueira se tornou uma epidemia. É triste, profundamente triste, perceber que neste mundo frenético e conectado diagnosticado como a sociedade do cansaço (Byung-Chul Han, 2015) ainda consigamos preencher o tempo que não temos com aquilo que não pode redimir nossas almas.
As redes sociais viraram nosso Coliseu de pão e circo, e não são poucos os momentos que se configuram como o espelho d’água Narcísico. Os dias são sombrios, escuros no horizonte existencial. A luz do Salvador bate à porta (Apocalipse 3:20), mas somos relutantes em deixá-la entrar. Porque, em verdade, amamos mais as trevas do que a luz. Enxergar significa reconhecer nossa condição de carência e miséria existencial (João 3:19), é dizer “não” ao espetáculo impresso pelos modelos de “redes sociais” e instituições ideológicas.
Sola Gratia. Porque se não for pela Graça, não será por nada.