NR-1: Lei pela saúde mental nas escolas.

Compartilhe em sua Rede Social

NR-1: O Cuidado com a Saúde Mental nas Escolas como Prioridade

Como psicanalista e psicopedagogo, tenho acompanhado com atenção as mudanças que a nossa sociedade exige em relação à saúde mental, especialmente no ambiente de trabalho. O universo escolar, com suas complexidades e demandas emocionais, não pode ficar alheio a essa realidade. A sobrecarga, a pressão por resultados e o assédio, infelizmente, não são estranhos à vida dos docentes. É por isso que a atualização da Norma Regulamentadora 1 (NR-1) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) representa um marco essencial, uma oportunidade para olharmos para o bem-estar de nossos professores com a seriedade que o tema merece.

Do que se trata a Norma Regulamentadora (NR-1)


A NR-1, que já é um pilar da legislação trabalhista, foi atualizada para se tornar ainda mais preventiva, com um foco no gerenciamento de riscos ocupacionais (GRO). A grande mudança, estabelecida pela Portaria MTE nº 1.419/2024, foi a inclusão expressa dos fatores de riscos psicossociais no GRO. Isso significa que todas as instituições, incluindo as escolas, têm a obrigação legal de identificar, avaliar e controlar todos os riscos presentes no ambiente de trabalho, o que agora inclui formalmente os que afetam a saúde mental.

A norma deixa claro que o foco está nos “fatores de risco psicossociais relacionados ao trabalho”. Ou seja, o objetivo não é avaliar a saúde mental individual dos trabalhadores, mas sim as condições de trabalho que podem gerar estresse, esgotamento, depressão, entre outros agravos à saúde. Problemas na concepção, na organização e na gestão do trabalho são o verdadeiro alvo da norma.

Quem são os profissionais indicados para aplicar a NR-1?


Uma dúvida comum é se profissionais como terapeutas, psicanalistas, psicopedagogos e psicólogos podem ser os responsáveis pela aplicação da NR-1. A Norma Regulamentadora não especifica um profissional único para a tarefa. A responsabilidade pelo GRO e suas etapas é da própria organização, que deve designar os responsáveis e selecionar profissionais com o conhecimento técnico adequado.

Minha visão como especialista é que, embora não sejam os únicos responsáveis, profissionais da saúde mental e da educação, como psicólogos e psicopedagogos, têm um papel fundamental e estratégico. Sua expertise pode ser o diferencial para:

  • Ajudar a escola a entender e identificar perigos psicossociais específicos da rotina escolar, como sobrecarga de trabalho e assédio.
  • Auxiliar na escolha da metodologia de avaliação mais adequada (questionários, oficinas ou observação).
  • Capacitar as lideranças em temas como comunicação não-violenta e escuta ativa.
  • Oferecer suporte para a criação de canais de escuta e denúncia sigilosos.

A melhor abordagem é sempre a multidisciplinar e multiprofissional, integrando o Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT), gestores, líderes de equipe e, principalmente, os trabalhadores.

Como deve ser aplicado na escola


A gestão dos fatores de risco psicossociais na escola deve ser realizada por meio da abordagem combinada das NR-1 e NR-17 (Ergonomia). O processo se inicia com a avaliação ergonômica preliminar (AEP), que é obrigatória para todas as escolas, independentemente do porte. A AEP, alinhada ao GRO, permite identificar os perigos, avaliar os riscos e implementar medidas de prevenção.

O processo não deve focar nos sintomas individuais dos professores, mas sim nas condições de trabalho a que eles estão submetidos.

Por exemplo, uma escola pode identificar que a “excesso de demandas no trabalho (sobrecarga)” é um perigo presente em todas as suas equipes. A partir dessa identificação, a gestão do risco não seria focar em um professor que apresenta ansiedade, mas sim nas causas da sobrecarga, como o volume de turmas, tarefas extracurriculares ou a má distribuição de tarefas.

O que a escola deve fazer para implantar a NR-1


Para implementar a NR-1 de forma eficaz, as escolas devem seguir um planejamento claro e transparente. O processo deve ser contínuo e documentado no Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR).

Passos Preliminares:

Verificar a necessidade de ajuda especializada: Se a escola não tem conhecimento ou experiência com o tema, pode buscar auxílio de profissionais externos, como psicólogos do trabalho ou consultores em SST, preferencialmente ouvindo a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio (CIPA).

Envolver todas as partes interessadas: É essencial que a alta administração, os níveis gerenciais, os profissionais de SST e todos os professores e colaboradores sejam envolvidos no processo.

Atribuir responsabilidades: Defina quem será responsável por cada etapa do processo.

Comunicar os trabalhadores: A comunicação transparente é fundamental. Explique aos professores por que a escola está fazendo essa avaliação e quais são os objetivos, para que eles se sintam seguros e engajados.

Implementação e Documentação:

Identificar e avaliar os riscos: Realize a Avaliação Ergonômica Preliminar (AEP) para identificar os perigos e avaliar os riscos. A escola pode optar por metodologias como a observação direta das atividades, a realização de workshops com os professores ou a aplicação de questionários padronizados. É vital garantir o anonimato dos participantes, se for o caso.

Documentar no PGR: Registre todo o processo no Inventário de Riscos Ocupacionais (IRO) e no Plano de Ação. No IRO, devem constar a caracterização dos postos de trabalho, a descrição dos perigos, as possíveis lesões e a avaliação dos riscos.

Adotar medidas de prevenção: Com base nos riscos identificados, a escola deve criar um Plano de Ação com um cronograma, responsáveis e metas claras. As ações podem incluir:

  • Revisar a carga horária dos professores e a distribuição de tarefas.
  • Implementar políticas internas de combate ao assédio.
  • Criar canais de escuta e denúncia sigilosos.
  • Oferecer capacitação em escuta ativa e comunicação para as lideranças.
  • Garantir pausas adequadas e regulares.

Acompanhar e revisar: O processo não termina com a implementação. As escolas devem acompanhar a eficácia das medidas e revisar o plano periodicamente, em um ciclo de melhoria contínua. A participação dos professores nesse acompanhamento é crucial.

Informações relevantes para professores e donos de escolas


É importante ressaltar que o Ministério do Trabalho e Emprego não indica uma ferramenta ou metodologia específica para a avaliação. A escolha deve ser da própria escola, em conjunto com os profissionais de SST. A chave para o sucesso é um bom planejamento.

Além disso, a implementação da norma em caráter punitivo para as escolas foi adiada para maio de 2026. Esse prazo estendido não deve ser visto como um relaxamento, mas sim como uma oportunidade valiosa para que as instituições se adaptem de forma planejada, sem pressa, construindo um ambiente de trabalho mais saudável e seguro para todos.

A NR-1 é um convite para que o ambiente escolar se torne um exemplo de cuidado e prevenção. O professor, o coração da escola, merece um espaço de trabalho que não apenas reconheça, mas que ativamente proteja sua saúde mental.

Referências Bibliográficas e Digitais


MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Guia de informações sobre os Fatores de Riscos Psicossociais Relacionados ao Trabalho. Brasília, 2025.

GALHARDI, Raul. NR-1: por lei, escolas terão que combater estresse e ansiedade docente. Academia Líderes da Educação. Disponível em: https://www.lideresdaeducacao.com.br/. Acesso em: 29 ago. 2025(https://www.gov.br/trabalho-e-emprego/pt-br/noticias-e-conteudo/2025/abril/inclusao-de-fatores-de-risco-psicossociais-no-gro-comeca-em-carater-educativo-a-partir-de-maio). Acesso em: 29 ago. 2025.