O Homem: Animal Político

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 O homem é um animal que não vive sozinho, pois todo ser humano, desde que nasce até o momento em que morre, precisa da companhia de outros seres humanos. Foi observando isso que o filósofo grego Aristóteles escreveu que o homem é um animal político, pois é a própria natureza humana que exige a vida em sociedade.

 

É importante lembrar que não é só para atender as suas necessidades materiais que o ser humano precisa da companhia de seus semelhantes. Na realidade, o homem é o único animal que durante vários anos depois do nascimento não consegue obter sozinho seus alimentos. E no mundo moderno isso está cada vez mais difícil, mesmo para os adultos, uma vez que a sociedade humana se organizou de tal modo que a grande maioria passa a vida toda consumindo alimentos produzidos por outros.
Mas ao lado disso é preciso assinalar que mesmo o homem mais rico, que tenha dinheiro para comprar e armazenar em casa os alimentos suficientes para toda sua a vida, mesmo esse homem não consegue viver sozinho.
E não é só porque necessita dos serviços dos outros seres humanos para a manutenção da sua casa, o preparo dos alimentos e o cuidado de sua saúde, mas porque todo ser humano tem necessidades afetivas, psicológicas e espirituais, que só podem ser atendidas com a ajuda e a participação de outros seres humanos.

Assim, portanto, a vida em sociedade é uma necessidade da natureza humana, não se podendo falar do homem como indivíduo sem lembrar que esse indivíduo não vive sozinho, mas está sempre relacionado com outros indivíduos. Pode-se resumir essa idéia dizendo que o homem é um ser social por natureza e, por isso, tudo que ele tem ou realiza é tido ou realizado em sociedade.
Outro dado importante que deve ser ressaltado é que todos os seres humanos valem exatamente a mesma coisa. Pondo-se lado a lado dois recém-nascidos, sem revelar a condição social de cada um, ninguém poderá dizer que um vale mais que o outro. Por natureza todos nascem iguais e é a sociedade que estabelece diferenças, o que significa que as diferenças de valor entre seres humanos são artificiais, não naturais. Essa igualdade essencial de todos os seres humanos foi reconhecida e proclamada há milênios e deve ser buscada na organização social, dando-se absoluta igualdade de oportunidades a todos, desde o momento do nascimento. É contra a natureza permitir que uns nasçam ricos e socialmente bem situados enquanto outros nascem miseráveis e condenados a uma vida de sacrifícios e privações e inferioridade social.
Esse reconhecimento da igualdade essencial de todos não quer dizer que não existem diferenças individuais. Embora todos tenham o mesmo valor cada um tem sua individualidade, seu modo de ser, suas preferências, suas aptidões, seu julgamento próprio a respeito dos fatos da vida. O que a experiência comprova é que pessoas criadas no mesmo ambiente, recebendo o mesmo tratamento, sendo educadas da mesma forma, ainda assim apresentam diferenças de comportamento e muitas vezes reagem de maneiras diferentes perante o mesmo acontecimento.
Há, portanto, vários pontos fundamentais que devem ser levados em conta quando se tratar da organização da sociedade. Todos os seres humanos necessitam da vida social e todos valem essencialmente a mesma coisa. Mas cada um tem as características próprias de sua individualidade e por isso a vida em sociedade, embora necessária, acarreta sempre a possibilidade de conflitos.
Na verdade, a ocorrência de conflitos deve ser reconhecida como normal numa sociedade de homens livres. Mesmo que sejam asseguradas oportunidades exatamente iguais a todos, desde o ponto de partida, ainda assim os conflitos não desaparecerão, pois eles decorrem das diferenças de individualidades.
Há pessoas que por medo, comodismo ou por qualquer outra razão têm horror ao conflito e imaginam que seja possível uma sociedade livre de conflitos. Não é raro que tais pessoas acreditem que pelo uso da força todos os membros de uma sociedade poderão ser obrigados a aceitar os mesmos valores, a cumprir passivamente as ordens dos superiores e a se comportar de modo igual em todas as circunstâncias. Mas a história da humanidade e os fatos de todos os dias e de todos os lugares demonstram que onde existirem pessoas vivas existirão conflitos.
Em conclusão, o ser humano não é apenas um animal que vive, é também um animal que convive, ou seja, o ser humano sente a necessidade de viver mas ao mesmo tempo também a necessidade de viver junto com outros seres humanos. E como essa convivência cria sempre a possibilidade de conflitos é preciso encontrar uma forma de organização social que torne menos graves os conflitos e que solucione as divergências, de modo que fique assegurado o respeito à individualidade de cada um.
Ao mesmo tempo, é preciso lembrar que todos os seres humanos são essencialmente iguais por natureza. Em consequência, não será justa uma sociedade em que apenas uma parte possa decidir sobre a organização social e tenha respeitada sua individualidade.

DALLARI, Dalmo de Abreu. O que é participação política. 5ª ed. SP: Abril Cultural – Brasiliense, 1984. (p.12-15)