Em 1999, a Unesco solicitou ao filósofo francês Edgar Morin a sistematização de um conjunto de reflexões que servissem como ponto de partida para se repensar a educação do século XXI.
Preparado a partir do trabalho conjunto de educadores em todo o mundo, o estudo resultou no livro “Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro”, que critica as falhas da educação e propõe novos caminhos para a formação de jovens, futuros cidadãos do mundo.
Os sete saberes indispensáveis enunciados por Morin são:
Evitar as cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão:
Como a percepção do mundo é sempre uma reconstrução, estamos todos sujeitos ao erro e a ilusão. É um problema de todos e cada um deve levá-lo em conta desde muito cedo e explorar as possibilidades de erro para ter condições de perceber a realidade.
Os princípios do conhecimento pertinente:
É preciso ter uma visão capaz de perceber o conjunto. É necessário dizer que não é a quantidade de informações, nem a sofisticação, que podem fornecer sozinhas um conhecimento pertinente, mas sim a capacidade de colocar o conhecimento no contexto.
O contexto tem necessidade de seu próprio contexto. E o conhecimento, atualmente, deve se referir ao global.
Por exemplo, os acidentes locais têm repercussão sobre o conjunto e as ações do conjunto sobre os acidentes locais
Ensinar a condição humana:
É curioso que nossa identidade seja completamente ignorada pelos programas de instrução. Podemos perceber alguns aspectos do homem biológico em Biologia, alguns aspectos psicológicos em Psicologia, mas a realidade humana é indecifrável.
Somos indivíduos de uma sociedade e fazemos parte de uma espécie. Ao mesmo tempo em que fazemos parte de uma sociedade, temos a sociedade como parte de nós, pois desde o nosso nascimento a cultura nos imprime.
Nós somos de uma espécie, mas ao mesmo tempo a espécie está em nós e depende de nós. Portanto, o relacionamento entre indivíduo-sociedade-espécie é como a trindade divina, um dos termos gera o outro e um se encontra no outro. A realidade humana é trinitária.
Ensinar a compreensão:
A palavra compreender vem do latim, compreendere, que quer dizer: colocar junto todos os elementos de explicação, ou seja, não ter somente um elemento de explicação, mas diversos.
A grande inimiga da compreensão é a falta de preocupação em ensiná-la.
Na realidade, isto está se agravando, já que o individualismo ganha um espaço cada vez maior. Estamos vivendo numa sociedade individualista, que favorece o sentido de responsabilidade individual, que desenvolve o egocentrismo, o egoísmo e que, consequentemente, alimenta a autojustificação e a rejeição ao próximo.
Por isso, é importante compreender não só os outros como a si mesmo, a necessidade de se autoexaminar, de analisar a autojustificação, pois o mundo está cada vez mais devastado pela incompreensão.
Enfrentar as incertezas:
Apesar das escolas ensinarem somente as certezas, como a gravitação de Newton e o eletromagnetismo, atualmente a ciência tem abandonado determinados elementos mecânicos para assimilar o jogo entre certeza e incerteza, da microfísica às ciências humanas.
É necessário mostrar em todos os domínios, sobretudo na história, o surgimento do inesperado.
As duas guerras mundiais destruíram muito na primeira metade do século XX. Três grandes impérios da época, por exemplo, o romano-otomano, o austrohúngaro e o soviético, desapareceram.
Assim tem acontecido em todas as etapas da história. O inesperado aconteceu e acontecerá, porque não temos futuro e não temos certeza nenhuma dele. As previsões não foram concretizadas, não existe determinismo do progresso.
Ensinar a identidade terrena:
O fenômeno da globalização que estamos vivendo hoje – e começou, na verdade, no século XVI com a colonização da América e a interligação de toda a humanidade – é um outro aspecto que o ensino ainda não tocou.
O crescimento da ameaça letal se expande em vez de diminuir: a ameaça nuclear, a ameaça ecológica, a degradação da vida planetária.
É necessário ensinar que não é suficiente reduzir a um só a complexidade dos problemas importantes do planeta, como a demografia, a escassez de alimentos, a bomba atômica ou a ecologia. Os problemas estão todos amarrados uns aos outros. É preciso mostrar que a humanidade vive agora uma comunidade de destino comum.
A ética do gênero humano:
Os problemas da moral e da ética diferem da cultura e da natureza humana. Existe um aspecto individual, outro social e outro genético, de espécie.
Algo como uma trindade em que as terminações são ligadas: a antropoética. Cabe ao ser humano desenvolver, ao mesmo tempo, a ética e a autonomia pessoal (as nossas responsabilidades pessoais), além de desenvolver a participação social (as responsabilidades sociais), ou seja, a nossa participação no gênero humano, pois compartilhamos um destino comum.
Tudo deve estar integrado para permitir uma mudança de pensamento, isto é, para que transforme a concepção fragmentada e dividida do mundo, que impede a visão total da realidade. Essa visão fragmentada faz com que os problemas permaneçam invisíveis para muitos, principalmente para governantes.
E hoje que o planeta já está, ao mesmo tempo, unido e fragmentado, começa a se desenvolver uma ética do gênero humano, para que possamos superar esse estado de caos.